COMO É SENTIR CHEIROS
Diferenciar os sentidos que o sistema neural é capaz de codificar dentro do encéfalo vem desde a antiguidade, com Demócrito, em 460 a.C., e as curiosidades não pararam desde então.
A medida que foram descobertos os sentidos individualmente e mais recentemente, no século XX o funcionamento de todo sistema neural humano, o sistema olfatório é para mim o mais interessante pois reconhece mais de 1000 cheiros diferentes [1] e contrariou teorias de que os neurônios são incapazes de proliferar depois de terminado o desenvolvimento ontogenético, uma vez que a proliferação e diferenciação de células basais ocorrem a cada 6 ou 8 semanas. 😉
POR QUE ACOSTUMAMOS COM CERTOS ODORES
Até hoje, foram descobertos os processos que o sistema olfatório passa e por mais que haja todo este conjunto de trabalho, este sistema é além de tudo, inteligente, pois é adaptável. Acredito que esta proteção de adaptação é nada mais que uma forma de não trabalhar no reconhecimento de algo já conhecido, deixando o trabalho mais pesado para algo que realmente importa, o novo. Exemplo do perfume, por mais que a pessoa goste dele, ela própria vai perdendo percepção sobre ele, enquanto aqueles que estão ao seu redor, sentem muito forte. Ou seja, as sinapses de ambos são diferentes em relação ao mesmo odor.
Tentou-se dividir os diversos cheiros, entretanto exceto os únicos classificados como feromônio e odorantes, todo o restante é percebido graças à combinação dos muitos quimiorreceptores e mecanismos moleculares, tão fortes e únicos para cada um que o sente.
A memória relacionada ao odor que até uma criança é capaz de identificar pode ser impactante como a perda de um ente querido. A criança se vê desamparada e se apega a uma peça de roupa que remete lembranças da pessoa ausente e dificilmente a uma fotografia, pois esta não consegue expressar toda subjetividade vivida por ele. Isso mostra que o sistema olfatório é mais sensível, pois os impulsos se propagam para o sistema límbico (bem como para as áreas corticais superiores).
CURIOSIDADE PARA AS MULHERES
O hipotálamo exerce influência no olfato e nos efeitos de manipulações hormonais tanto que entre mulheres que convivem muito tempo juntas, têm o período menstrual regulado entre si. Ou seja, quando uma ovula, este odor dos hormônios inalado pela companheira, é reagido pelo corpo como uma competição quanto ao acasalamento, fazendo com seu organismo promova ovulação também na mesma época. Desta forma é nítida a ligação em cadeia que o olfato consegue transmitir ao restante do corpo.
A RELAÇÃO GOSTO/CHEIRO
O mesmo corpo que intermedia sistema gustatório ao olfatório durante a alimentação, processo observado durante a primeira ingestão de qualquer alimento, com resultados agradável ou não. Quando esta reação é negativa, ao sentir o cheiro, e este remete ao gosto, a vítima já se recusa a ingerir, por adiantar um sofrimento, graças às substâncias químicas na cavidade oral e nasal que trabalham conjuntamente.
Desta forma, o olfato tem importância relevante no sistema neural aos demais sentidos, talvez por esta razão o nariz esteja em um nível avantajado do resto do corpo, mais proeminente, adianta-se e evita aborrecimentos, e como um ser curioso, sempre encontra novidades pela frente.
DOENÇAS RELACIONADAS
Anosmia é o nome dado à perda de olfato, já tão falada nos sintomas do covid-19. Há diversos nÍveis para que se consolide a anosmia.
Asma, a rinite e a rinossinusite são doenças que atuam diretamente no sistema olfatório.
Síndrome de Kallman e síndrome de Charge, ambas doenças genéticas estão associadas a perda de olfato [2,3].
Devemos ficar atentos a perda do olfato como sinal de enfermidades além dos declínios de sentidos do avanço da idade.
Para os idosos, atenção ao diagnóstico de doença de Parkinson, os pacientes relatam perda de olfato desde muito antes. “A patologia de Lewy e a anosmia ou hiposmia clínica podem ser detectadas anos antes dos sintomas motores se apresentarem, , sugerindo que o comprometimento olfativo pode ser uma das primeiras manifestações de sinucleinopatia” Há muitos estudos sobre testes para acompanhar a evolução. O exame pode ser feito com diferentes odores, onde somente os acertos são contabilizados [4]. E já existe evidência de que “Um conjunto reduzido de oito odores poderia ser usado como uma ferramenta rápida na avaliação de pacientes com Parkinson”[5].
E a atenção se volta mais a este sinal quando um estudo longitudinal feito com mais de 2289 idosos entre 71 e 82 anos, afirma “Em comparação com participantes com bom olfato, aqueles com olfato ruim tiveram um risco cumulativo 46% maior de óbito no ano 10… e mais da metade (1211), morreu no ano 13” [6].
Referência:
1 – https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/1840504/
2 – https://eg.uc.pt/bitstream/10316/28963/1/tese%20In%c3%aas%20Ferraz.pdf
3 – http://www.spedmjournal.com/files/section/e10_s144_s_ndrome_de_charge_uma_causa_rara_de_hipogonadismo_hipogonadotr_fico_file.pdf
4 – https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6453781/
5 – https://movementdisorders.onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/mds.26637
6 – https://www.acpjournals.org/doi/10.7326/M18-0775?utm_medium=copytext&utm_source=artigoportal
7 – LENT, Roberto; Cem bilhões de Neurônios, 2a edição, Ateneu Editora, 2005